Com a manifesta intenção do petista de não cumprir pena no regime semiaberto, procuradores fizeram o incomum pedido de progressão de pena

Veja

Por Leonardo Lellis

Publicado em 1 out 2019

 

Desde que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) manifestou seu interesse de não deixar a sala onde está preso na superintendência da Polícia Federal em Curitiba sem que sua alegada inocência seja reconhecida pela Justiça, os procuradores da Lava Jato partiram para um lance inusitado, caro aos advogados de defesa: resolveram pedir a progressão de regime do petista, que já cumpriu 1/6 de sua pena e alcançou o direito de cumpri-la em parcial liberdade.

A intenção da Lava Jato de pedir a progressão de regime do petista foi antecipada pelo Radar. No pedido apresentado à Justiça, os procuradores alegaram que, além de ter atingido o tempo previsto em lei, o ex-presidente também tem bom comportamento. A juíza Carolina Lebbos, responsável pela execução da pena de Lula, é quem deve decidir se aceita. Por enquanto, ela pediu à PF um relatório sobre a conduta de Lula na sala que ocupa desde abril de 2018.

“Lula não aceita qualquer condição imposta pelo Estado, porque não reconhece a legitimidade do processo que o condenou e que o trouxe ao cárcere, onde ele está neste momento”, disse o advogado Cristiano Zanin Martins, que defende Lula, em entrevista na saída da PF em Curitiba. Em carta, o petista afirmou que não troca sua dignidade pela sua liberdade e que não aceita barganhar seus direitos.

De tão incomum, a situação divide até especialistas sobre o direito de Lula recusar a progressão de regime. O criminalista Fernando Castelo Branco afirma que por se tratar de um “direito” e não uma obrigação, o ex-presidente pode rejeitar o benefício. Já João Paulo Martinelli entende que o petista não pode recusar a progressão, mas as condições impostas pela Justiça.

Entenda as chances de Lula ganhar liberdade:

Por que Lula não quer ser solto?
O petista afirma ter sido vítima de um processo injusto conduzido de forma parcial pelo ex-juiz federal Sergio Moro e os procuradores da Lava Jato. Como já indicou em sua carta, ele aposta suas fichas no Supremo Tribunal Federal, que está prestes a julgar um pedido de sua defesa para que reconheça a parcialidade e anule o processo do tríplex do Guarujá, no qual foi condenado. Ele também espera o desfecho do julgamento que decide a ordem de alegações finais de delatores e delatados, marcado para esta quarta, do qual também poderá se beneficiar. O petista ainda acompanha se a corte irá mudar seu entendimento para impedir a prisão antes do trânsito em julgado.

O que é o regime semiaberto?
É o benefício concedido a preso que apresenta bom comportamento e que já cumpriu um sexto de sua pena. Em tese, deve ser cumprido em uma colônia agrícola ou em casas de albergados, onde ele dorme e passa o dia em trabalhando em liberdade. Quando não há vagas suficientes nesses dois tipos de estabelecimentos, é comum que a Justiça conceda o regime domiciliar com o uso de tornezeleira eletrônica. Por ser ex-presidente, Lula também tem garantia de cumprimento de pena em uma sala de estado-maior e seu domicílio é em São Bernardo do Campo, o que o afasta destes estabelecimentos.

Qual é o prazo para a juíza Carolina Lebbos decidir?
Nesta segunda-feira, 31, ela deu cinco dias para que se manifestem a defesa e a PF, que deve apresentar um relatório sobre o comportamento de Lula. Acontece que este prazo só começa a correr a partir do momento em que cada parte toma ciência da intimação no processo eletrônico — após 10 dias, este conhecimento fica presumido. Na hipótese mais rápida, a contagem de prazo dado por Lebbos terminaria no próximo sábado, mas, por se tratar de um fim de semana, ele é estendido até segunda.

Lula pode se recusar a aceitar a progressão de regime?
Já que se trata de um direito, o réu pode recusá-lo integralmente ou simplesmente se recusar a cumprir os requisitos impostos pela juíza Carolina Lebbos. Se Lula não aceitar usar tornozeleira, eletrônica, por exemplo, ele não poderá deixar a superintendência da Polícia Federal.

Caso Lula se recuse a cumprir as condições impostas pela Justiça, fica configurado mau comportamento?
Sim. E ele perde o direito à progressão.

Lula pode voltar a ser preso?
Sim. O petista já foi condenado em primeira instância no caso do sítio de Atibaia, cujo recurso está pendente de julgamento no Tribunal Regional Federal da 4ª Região — o que é previsto para acontecer até novembro. O processo da doação de um terreno pela Odebrecht também está pronto para julgamento na 13ª Vara Federal de Curitiba.

O petista recupera o direito de se candidatar?
Com a condenação em segunda instância no processo do tríplex, Lula tornou-se inelegível. Uma eventual progressão de regime não altera este quadro. Segundo a especialista em Direito Eleitoral Marilda Silveira, o ex-presidente só recupera seus direitos políticos caso a decisão do TRF4 seja anulada e o processo retorne para a primeira instância, ou sua inocência seja reconhecida.