Se ex-presidente for considerado culpado, TRF-4 irá esperar o fim de todos recursos no tribunal. Ele pode recorrer ainda ao STJ ou STF.

By Marcella Fernandes

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Apesar da expectativa pelo julgamento em 2ª instância do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado a 9,5 anos de prisão, o resultado no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre (RS), não representa um desfecho do caso. Mesmo se a condenação for mantida nesta quarta-feira (24), o petista não será preso de imediato.

A prisão após a condenação em segunda instância passou a ser permitida após um julgamento em fevereiro de 2016 no STF (Supremo Tribunal Federal). O TRF-4, contudo, irá esperar uma decisão final do tribunal sobre o caso. O julgamento do tipo mais simples de recurso pode levar cerca de dois meses.

De uma eventual condenação dos juízes gaúchos, ainda cabe recorrer ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) e ao STF. Mesmo com um mandado de prisão, Lula pode pedir para responder em liberdade até esses recursos se esgotarem.

“Ele pode impetrar um habeas corpus e tem chances reais de conseguir [um resultado positivo] porque o STF, embora tenha se manifestado no sentido de que a prisão pode acontecer com a decisão condenatória em segunda instância, em alguns casos, tem revisto esse posicionamento”, afirmou ao HuffPost Brasil Fernanda de Almeida Carneiro, criminalista e professora do IDP-São Paulo.

O ministro Gilmar Mendes, por exemplo, já se manifestou publicamente no sentido de que tende a rever esse entendimento. Em agosto de 2017, ele concedeu um habeas corpus contra prisão após a condenação em segunda instância.

De acordo com Carneiro, argumentos possíveis da defesa são que o petista tem respondido em liberdade ao longo de todo o processo, não se furtou a participar das audiências, esteve à disposição quando solicitado e não deu indicativos de que pretendia fugir. “Existem chances reais de que o ex-presidente, ainda que condenado, consiga recorrer em liberdade”, diz a criminalista.

 

Prisão antecipada de Lula

A outra possibilidade de uma detenção imediata, seria um pedido de prisão antecipada pelo Ministério Público Federal. O procurador regional da República Mauricio Gotardo Gerum, contudo, descartou essa possibilidade.

“Qualquer medida relativa ao cumprimento de pena seguirá o normal andamento da execução penal, não havendo razões para precipitá-la”, afirmou o procurador, em nota.

Esse tipo de pedido seria justificado no caso de risco de fuga, por exemplo. O TRF-4 pode, entretanto, determinar medidas cautelares, como a entrega do passaporte ou obrigatoriedade de comparecimento ao fórum, no caso de uma condenação.

 

Tríplex do Guarujá

Nesta quarta-feira, a 8ª Turma do TRF-4 julga recurso contra a decisão do juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara de Curitiba, responsável pelos processos da Operação Lava Jato na primeira instância da Justiça Federal.

Lula foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá (SP). O Ministério Público Federal acusa o ex-presidente de ter recebido R$ 3,7 milhões de propina da OAS. O petista nega a acusação.

Na sentença, Moro argumenta que a configuração dos crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro, “que pressupõem estratagemas de ocultação e dissimulação”, não exigiu para sua consumação a transferência formal da propriedade do Grupo OAS para o ex-presidente.

Sobre o interrogatório de Lula, o magistrado afirma que “a única explicação disponível para as inconsistências e ausência de esclarecimentos concretos é que, infelizmente, o ex-presidente faltou com a verdade dos fatos em seus depoimentos acerca do apartamento 164-A, tríplex, no Guarujá”.

“Foi, portanto, um crime de corrupção complexo e que envolveu a prática de diversos atos em momentos temporais distintos de outubro de 2009 a junho de 2014, aproximadamente”, diz Moro.

 

O que acontece se o TRF-4 condenar Lula

No julgamento do TRF-4, Lula pode ser absolvido ou condenado. Se a condenação for por unanimidade, só cabe um tipo de recurso no tribunal, os embargos declaratórios, que servem para desfazer eventual omissão ou obscuridade da decisão.

Neste caso, o recurso é analisado apenas pelo relator, o desembargador João Pedro Gebran Neto. A defesa tem até dois dias após o julgamento da 8ª Turma para interpor os embargo infringentes e não há prazo para o juiz responder. A média, contudo, é de cerca de dois meses.

Já no caso de divergência na condenação, ou seja, um resultado de dois contra um, cabem os embargos infringentes. Gebran teria de escrever um novo voto e haveria um novo julgamento.

“Outros desembargadores que não participaram dessa decisão vão ter de ficar a par do caso. Eles podem eventualmente pedir vista dos autos para se inteirar mais profundamente. Pode se prolongar por muitos meses”, explica Fernanda Carneiro, do IDP-São Paulo.

No caso de absolvição, também cabem recursos, por parte do Ministério Público.

 

Mesmo condenado, Lula pode ser candidato

A Lei da Ficha Limpa prevê que o candidato pode ser tornar inelegível por oito anos se for condenado em segunda instância por crimes como corrupção e lavagem de dinheiro.

Apesar dessa determinação, ainda que o TRF-4 confirme a condenação de Lula e ele não consiga uma liminar que regularize sua candidatura numa instância superior, o petista pode se registrar como candidato na Justiça Eleitoral.

O prazo para o registro é 15 de agosto. Em seguida, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) analisa o pedido do ex-presidente. No caso de negativa, há possibilidade de recurso e a campanha pode continuar em curso nesse período.

A propaganda eleitoral começa em 16 de agosto. O primeiro turno está previsto para 7 de outubro e o segundo para 28 de outubro.

O petista deve ser lançado como pré-candidato nesta quinta-feira (25). Lula lidera a disputa pela Presidência da República, com mais de 30% das intenções de voto em todos os cenários, de acordo com o Datafolha. Ele também ganharia uma eventual disputa em segundo turno, segundo a sondagem.

 

A estratégia da defesa de Lula

No TRF-4, a defesa do ex-presidente argumenta que o único resultado possível é sua absolvição. A estratégia é explorar contradições na investigação. Em entrevista ao HuffPost Brasil, Valeska Teixeira Zanin Martins, uma das advogadas de Lula, afirmou que “o próprio Moro declarou que nunca disse que havia dinheiro ilegal saindo da Petrobras e sendo trocado por vantagens indevidas dadas a Lula”.

Os advogados do petista defendem que a prisão após condenação em segunda instância fere princípio da presunção da inocência. Eles argumentam ainda que o único regime “compatível” para o cumprimento de pena seria o aberto, devido a circunstâncias “favoráveis” e à idade de Lula, com 72 anos.

Se o processo de Lula chegar ao STF ou ao STJ, os tribunais superiores não podem analisar o mérito, apenas se houve irregularidades na tramitação, como a violação da ampla defesa e do devido processo legal, duas garantias constitucionais, por exemplo.

Valeska Teixeira Zanin Martins lembra duas decisões do juiz Sérgio Moro que serão exploradas pela defesa. Em março de 2016, o juiz autorizou uma condução coercitiva do petista e o grampeamento de ligações telefônicas. “Todas essas violações não foram reparadas, não foram de alguma maneira corrigidas ou suspensas”, afirmou.

Os defensores do ex-presidente pretendem ainda recorrer ao Comitê de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas), no caso de um resultado desfavorável ao petista no TRF-4.